Arte por kid_on_sugar

Eu sou de uma geração de skatistas que pouco conheceu a expectativa de uma manobra. Se a geração anterior a minha esperava uma cara pra conseguir um vídeo (VHS ou DVD) pra ver uma manobra cuja foto tinha saído na revista, hoje a gente tem tudo na hora.

Fiquei pensando nisso depois de ver a capa – chique demais – da edição 213 da CemporcentoSKATE, foto absurda do André Calvão retratando um BS 360 do Vinicius Costa na escadaria da Catedral da Sé.

Essa trick já estava na minha cabeça há uns 2 meses, desde que o Felipe Espíndola (@espetera) postou uma foto do pico clássico comentando o acerto do Vini. E pronto, já começam a especular qual foi a manobra, quando rola a filmagem, quantas tentativas, etc…

Fazia muito tempo que isso não acontecia comigo, e acredito que seja por conta da imediatez em que as coisas no mundo do skate tem acontecido. Cara volta a manobra e ela já tá na part 1 semana depois, isso quando não vai direto pro insta. Não tem mais uma preparação pro que vem, não tem nada que te instigue a esperar o vídeo sair, parada que se perdeu com a diminuição da força nas mídias físicas.

A fotografia no skate tinha – e ainda tem, mas em menor peso – esse papel, quando viamos anúncios ou capas nas revistas, de manobras que iriam estar em alguma part ou full lenght. A última vez que isso rolou comigo provavelmente com essa foto abaixo, que saiu numa entrevista do Nick Garcia pra Thrasher de Fevereiro de 2017.

Backside Noseblunt, foto por David Broach

Eu lembro que fiquei MUITO encucado pra saber como aquilo tinha acontecido porque, bom, é só olhar o pico e imaginar que não é a coisa mais simples do mundo encaixar um noseblunt daquela altura. Na real o pico é difícil pra qualquer coisa né, mas ok. Fiquei meses esperando essa trick, lembro que quando o vídeo da Etnies (Album, 2018) saiu eu fui na seca assistir, e nada. Não tava lá a manobra, que só veio aparecer no Peace da Element, bem mais de um ano depois.

O mesmo aconteceu com uma manobra do Omar Salazar, que foi capa da The Skateboard Mag na edição de setembro de 2014, que quando saiu eu fiquei muito tempo tentando entender o que era aquilo. Achei que a filmagem ia aparecer no We Are Blood – o que graças a Deus não aconteceu – e acabou vindo a tona somente em novembro de 2015 com o Chronicles 3 da Nike SB, vídeo que inclusive alguns membros desse coletivo ficaram acordados até às 4h da manhã só pra assistir assim que subisse na internet.

Ollie caindo numa montanha russa, foto por Seu Trinh

Enfim, esses são só alguns dos exemplos da força que a fotografia, principalmente quando impressa, tem em criar significados e expectativas dentro do skate. Eu por exemplo fui reassistir todas essas parts, e ouvi um álbum inteiro do Deerhunter (Microcastle, 2008) só porque vi as imagens e fui fazendo conexões na cabeça. E isso aparentemente tem se perdido com o tempo.

Eu sei, de certa forma eu estou lidando com um saudosismo que nem é meu, já que comecei a andar de skate pós anos 10, e tenho consciência que tô inserido nessa geração de Instagram. Mas sempre que posso experienciar, mesmo que um pouco, dessa relação que a galera mais velha tem com o skate, eu acho muito massa.

Um último caso do que quero falar é da manobra que fecha a part do Tyshawn Jones no Away Days (2016) da Adidas, um varial flip na fonte do finado Love Park. Com a quantidade de pessoas na praça, foi uma preocupação gigante que alguém filmasse ou fotografasse a manobra e soltasse na internet logo depois, expondo antes da hora. Uma loucura pensar que isso é necessário, mas a mania de registrar e postar tudo que acontece o tempo todo já é uma realidade.

Foto por Jonathan Mehring

Por isso fico muito feliz sempre que essa ansiedade boa bate em relação a alguma foto, e ver isso saindo na capa da última revista de skate impressa do país é muito foda. Talvez precisamos retornar um pouco e olhar para a forma como o skate era encarado há algumas décadas, pra não acabarmos nos perdendo na avalanche que é a internet.

A discussão sobre mídias do skate é um prato cheio do qual pretendemos falar sobre em algum futuro próximo quando a preguiça deixar. Enquanto isso, deixo aqui a sugestão de assistirem o documentário “Devoted” do artista francês Lucas Beaufort, que aborda a história, a importância e o possível futuro da mídia impressa no skate. Com o fim de tantas revistas, nacionais e gringas nos últimos anos, talvez já tenha passado da hora de pensarmos sobre o assunto. Mas isso fica pro(s) outro(s) texto(s).

*A arte no início do texto é do kid_on_sugar, segue o menino lá!

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